Geraldo Gargalhada, Geraldo Colombo… Meu grande amigo Geraldo.
Naquele dia em que nos encontramos em uma exposição de carros de corrida no Estádio de Remo e depois caminhamos até o pequeno parquinho em frente à hípica na Lagoa, a minha vida começou a mudar. O mundo começava a tornar-se maior que a família, a escola, o edifício e o clube. Havia uma intensa alegria nos seus olhos quando brincávamos inocentemente no auto-pista, o carrinho de bater. Não sei como se estabelece a passagem da infância para a adolescência nem mesmo se é desta passagem que eu estou falando. Mas foi definitivamente, uma passagem.
A paixão pelo automobilismo era coisa rara naqueles tempos em que o Chico Landi já não fazia sucesso e um desconhecido Emerson Fittipaldi ainda dava suas primeiras entortadas nas precaríssimas pistas brasileiras. Essa paixão catalisou nossa amizade por anos a fio. Juntos freqüentamos o clube, a praia, as festas, passamos tantos carnavais em Cabo Frio, fizemos vestibular e jogamos fora incontáveis longas conversas pelas esquinas de Laranjeiras. Mas mais do que tudo respirávamos automobilismo.
Geraldo virou família. Assistíamos aos GPs lá em casa, o meu pai junto. Papai abria uma cerveja que bebíamos acompanhada de sardinha na rodela de pão francês. O Geraldo passou a chamar o Velho de pick-up quando soube que um dia seu apelido fora João Vitrola. De vitrola para pick-up foi um passo. O apelido que só ele usava era sua forma de mostrar que a pessoa era especial para ele. Em algum momento eu mesmo virei Jotacê. Geraldo tinha também um caminho diferente de todo mundo para cada destino. Literal e literariamente falando.
Viramos ratos de autódromo no Rio e em Interlagos. Fomos ajudantes de mecânico, torcedores de arquibancada, comissários de box na Fórmula 1, bandeirinha de pista tudo mais. Graças ao Geraldo conheci de perto os ídolos nacionais da época. Sentávamos para almoçar com eles após as corridas na Barra, ouvíamos histórias de automobilismo e até contávamos as nossas. Seu carisma e sua inconfundível gargalhada abriam todas as portas. E eu ia junto. Éramos felizes e sabíamos muito bem disso.
A vida de engenheiro não foi fácil a partir da década perdida de 80. Geraldo buscou a sorte em São Paulo e por lá ficou. Era janeiro de 1990 quando tocou muito cedo o telefone lá em casa. Acordamos meio assustados naquele frio danado que fazia em Madrid. Era o Geraldo, para que eu não me esquecesse do meu aniversário de casamento, como fazia ano após ano.
A distância e o tempo têm o implacável efeito que os mais rodados já aprenderam. As notícias ficaram escassas até sumirem de vez. Mas há uns cinco anos decidi procurá-lo. Quando nos falamos parecia que tudo havia sido ontem. Seguimos trocando emails, fotos e finalmente nos encontramos e jantamos com as respectivas em uma noite memorável. Resumimos os últimos quinze anos naquelas poucas horas. Este blog, com as coisas do automobilismo, ajudou a manter o contato à distância.
Não me dei muita conta quando ele deixou de responder a um email. Este mês no dia do meu aniversário, vim a saber por caminhos que só o Geraldo poderia traçar, por que ele não havia respondido. Há pouco mais de um ano e meio, em algum ponto da estrada entre o Rio e São Paulo, os improváveis caminhos do meu amigo o levaram inexoravelmente para longe nosso convívio.
Como disse, não sei muito bem como se estabelecem as passagens de uma fase a outra da vida. Sinto apenas que eu estou vivendo mais uma e, mais uma vez, o meu querido Geraldo está novamente presente.