Acordou mais cedo que de costume. Inclinou-se sobre a pia do banheirinho apertado, lavou o rosto esfregando os olhos e caprichou na barba ralinha. Sem fazer barulho vestiu o jeans ainda novo e calçou as botas baratas. Passou o café, esquentou o pãozinho de ontem e se alimentou para o dia de trabalho. Colocou a camiseta favorita e, sobre ela, a surrada jaqueta.
Beijou a esposa, muito jovem, e saiu de casa sem acordá-la.
Welliton amarrou a presilha do capacete, curtiu por um instante o barulho do motor da Honda novinha e seguiu para o Centro do Rio. Mais cuidadoso que de costume, buzininha tocando entre carros e pedestres, Welliton ziguezagueou pelas ruas do Rio de Janeiro em sua rotina de motoboy. Concluiu feliz suas tarefas.
Uma chuvinha fina caiu sobre a cidade no fim do dia. Com a capa de plástico Welliton pegou o caminho de casa. De repente o ônibus raspou no cone de tráfego e o jogou na sua frente. Com uma rápida guinada, desviou do obstáculo mas a roda resvalou num tachão. Enquanto sentia a moto escapar debaixo de si ainda pensou:
“Malditos tachões”!
Nada mais a fazer. A moto tombou e deslizou na direção do guardinha que, insanamente, controlava o tráfego no meio da avenida movimentada.
Do asfalto, após seu corpo quicar várias vezes sobre os tachões, Welliton viu pessoas correndo em sua direção. Viu o guarda caído mais adiante. Em vão tentou se mexer. A vista foi ficando turva e as forças lentamente abandonando seu corpo.
Amanhã a jovem esposa do motoboy acompanhará o marido pela última vez. No seu ventre, o sonho do casal ainda não sabe que nascerá sem o pai.
Menos mal para o controlador de tráfego que em seis meses poderá voltar ao trabalho. Esperemos que nunca mais para o meio do trânsito pesado da Av. Rio Branco.
Fotos by Cariocadorio.