A campanha eleitoral no Brasil, em vez de esperança, nos escancara a triste realidade política do país. A propaganda de baixo nível em todas as frentes, os mesmos candidatos de sempre muitas vezes seguidos por seus filhos e parentes e uma horda de famosos querendo uma boquinha nos cofres públicos.
Foi neste clima que me lembrei de uma carta do meu amigo Marcello Senna, recebida há muitos anos. Estávamos em lugares distintos ambos longe do Brasil quando ele passou umas férias no Rio. Sem internet e DDI caríssimo, as notícias chegavam devagar, pelo correio. Nesta expectativa abri a carta cheio de curiosidade. Para minha surpresa, no lugar das longas e detalhadas linhas que Marcello costumava enviar, apenas um improvável poema que, na realidade, parecia dizer tudo. Encontrei-a no velho baú e a transcrevo fielmente.
De Passagem
Recebeu-me triste a minha terra.
Como era feio o cinza no céu
E a cinzenta Avenida’sil
Sobre antes cores
Pintaram collors e covas
E da esperança, tanto que antes,
Restava o nada
Nos olhos tristes de toda a gente
Mas ainda há praias
Onde crianças brincam
Avenidas
Onde se pisam os homens
E o Rio continuará lindo,
Sujo,
Cheirando mal
Marcello S. Senna
Do Rio de Janeiro, RJ, Brasil e
Suwanee, Georgia, EUA
Setembro 1989
Foto do site O Globo: Eleições 1989